Goya foi igualmente brusco ao revelar os vícios da Igreja e do Estado. Seu desgosto em relação à humanidade seguiu-se a uma doença quase fatal em 1792, que o deixou completamente surdo. Durante a recuperação, isolado da sociedade, começou a pintar demônios do seu mundo interior de fantasia – início de uma preocupação com criaturas bizarras, grotescas, e sua obra madura.
O pintor também foi mestre em artes gráficas. Suas 65 gravuras “Os Desastres da Guerra”, de 1810-14, são francos exposés das atrocidades cometidas por ambos, o exército francês e o espanhol, durante a invasão da Espanha. Com precisão sangrenta, reduziu cenas de tortura bárbara ao básico horror. Seu olhar sobre a crueldade humana era firme: castrações, desmembramentos, civis degolados empalados em árvores nuas, soldados desumanizados contemplando indiferentemente corpos linchados.
“O 3 de Maio de 1808, Francisco Goya - 1814
“O 3 de Maio de 1808” é a resposta de Goya ao massacre de cinco mil civis espanhóis. As execuções eram represálias a uma revolta contra o exército francês em que os espanhóis foram condenados sem se levar em conta culpa ou inocência. Aqueles que possuíam um canivete ou uma tesoura (“armas portáteis”) foram obrigados a marchar diante do pelotão de fuzilamento em lotes.
A pintura tem o aspecto imediato do fotojornalismo. Goya visitou o cenário fazendo esboços; no entanto, porque se desvia do Realismo, dá a ela uma força adicional.
Ele iluminou a cena noturna colocando no chão uma lâmpada que projeta uma luz forte. No fundo, a igreja está escura, como se toda a luz da humanidade tivesse se extinguido., Cadáveres ensanguentados se lançam em direção ao expectador, enquanto uma fila de vítimas se estende na distância. As vítimas do momento constituem o foco de interesse, com um homem de camisa branca de braços bem abertos num gesto desafiador, mas impotente, lembrando o Cristo crucificado. As sombras ácidas e a ausência de harmonia na cor sublinham a violência do evento.
Em outras pinturas daquela época, a guerra era sempre apresentada como um espetáculo glorioso e os soldados como heróis. Goya contrastou os rostos das vítimas e os gestos desesperados com as figuras sem rosto, parecendo autômatos, do pelotão de fuzilamento. Apesar de a surdez ter isolado Goya da humanidade, ele comunica apaixonadamente seus fortes sentimentos a respeito da brutalidade e da desumanização da guerra.
Carol Strickland. Arte Comentada. Da Pré-História ao Pós Moderno
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