Chamado “Esfinge de Delft” devido ao mistério sobre sua vida, o pintor Johannes Vermeer (1632-1675) é hoje considerado secundarista apenas a Rembrandt dentre todos os artistas holandeses. Morou em Delft, sua cidade natal, até morrer, falido, aos 43 anos, deixando mulher e 11 filhos. Poucos são seus quadros sobreviventes, apenas 35 a quarenta. Talvez ele não tenha pintado outros, pois nenhum pintor desde Ingres trabalhou com tanta deliberação.
E nenhum pintor, exceto van Eyck, tinha tanta técnica quanto Vermeer no domínio da luz. Enquanto outros artistas usavam uma gama de cinza/verde/marrom, as cores de Vermeer eram mais puras e vívidas, com uma intensidade de brilho jamais vista.
Além da maestria na cor e na luz, as composições perfeitamente equilibradas, de formas retangulares, emprestavam serenidade e estabilidade a seus quadros. Uma tela típica retrata um aposento limpo, fracamente iluminado por uma janela à esquerda e uma figura empenhada numa simples tarefa doméstica. O que eleva o tema acima da banalidade é a incisiva representação da realidade visual, as cores perfeitamente verdadeiras para o olho e a luz suave que se irradia pela sala. Seus quadros não contém história, paixão ou evento. Seu verdadeiro tema é a luz, suave, doce, quase palpável, vagando pelas diversas superfícies da imagem.
Vermeer usou uma “câmara obscura” para obter maior perfeição do desenho. Consiste numa caixa escura com uma abertura minúscula por onde se projeta a imagem do objeto a ser traçado numa folha de papel. No entanto, Vermeer não se limitava a copiar as linhas de cena projetada. Seu manuseio da tinta também foi revolucionário. Embora as pinceladas pareçam planas e detalhadas nas reproduções, Vermeer frequentemente aplicava a tinta em esfregadelas e pontilhados de modo que a superfície saliente de um ponto na pintura refletisse mais luz, dando vibração e textura tridimensional mais áspera. Essa técnica se aproximava do pontilhismo dos impressionistas. Um crítico descreveu essa superfície como uma “mistura de pérolas socadas”.
“A Criada de Cozinha”, Johannes Vermeer, c. 1658
Esse método de definir as formas, não com linhas, mas com pontinhos de luz é evidente em “A Criada de Cozinha”, especialmente no contorno da abertura da jarra de leite, um mosaico de manchinhas. Vermeer foi também um mestre na variação de intensidade da cor em relação à distância entre o objeto e a fonte de luz. O pão crocante captura a luz mais forte e a reflete através de toques precisos de impasto (tinta aplicada em camada grossa). Atento demais aos pormenores, para evitar a monotonia da parede caiada de branco. Vermeer acrescentou-lhe manchas, buracos e até um prego. A composição é tão equilibrada e coesa que remover apenas um dos elementos ameaçaria a estabilidade do quadro. Embora despida de incidentes dramáticos, a absoluta concentração da criada na tarefa confere ao trabalho um ar majestoso. A respeito de Vermeer, um crítico observou que: “Nenhum pintor holandês homenageou tanto a mulher.”
Carol Strickland. Arte Comentada, Da Pré-História ao Pós-Moderno.
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